Espiritualidade e Saúde Mental
Ir. Marinêz Arantes da Silva, OSF
Até há pouco tempo, pensava-se que ciência e espiritualidade não podiam se misturar. Não era possível visualizar nenhuma ligação entre as duas áreas, muito menos fazer qualquer conexão entre saúde e espiritualidade. Com o redimensionamento do conceito de saúde pela Organização Mundial de Saúde – OMS, entendendo que a saúde não é apenas ausência de doenças, mas o bem-estar completo da pessoa, passou-se a considerar o ser humano de forma mais completa, daí vários aspectos devem ser levados em conta, para que se possa entender o estado de saúde da pessoa, inclusive a dimensão da espiritualidade, que foi admitida pela OMS em 1998.
Pode-se afirmar que considerar e integrar espiritualidade e religiosidade à área da saúde mental tem sido método que atesta os benefícios deste mecanismo. Pacientes e familiares, que passam por situação de comprometimento da saúde mental, ameaçados na sua existência, precisam encontrar nos profissionais que os assistem uma forma que possa possibilitar a recuperação de sua saúde psicológica, emocional e também da saúde existencial, lembrando que a espiritualidade faz parte da existência humana.
Para Peres (2007), cada vez mais a ciência se curva diante da grandeza e da importância da espiritualidade na dimensão do ser humano. O ser humano experiencia a busca de sentido e de significado e tem sede de valores que o influencie a partir do interior, os quais fundamentam o alicerce de suas vidas. Na ausência desses valores, surge a sensação de insegurança e desamparo, algo que provoca a desintegração psicológica e mental do indivíduo.
A Espiritualidade é algo que vai além da religião, mesmo que a religião seja uma das formas de expressar e vivenciar a espiritualidade. Nesse sentido, a religião ao mesmo tempo que pode ser um meio para ajudar a superação das doenças psicológicas, pode também ser instrumento de maiores complicações, podendo levar ao agravamento dos transtornos mentais.
No consultório, é possível detectar distúrbios agravados por orientações religiosas inadequadas, causando dor profunda na alma das pessoas que acreditam cegamente nos líderes religiosos que aproveitam da vulnerabilidade de seus fiéis para manipular e exercer poder sobre eles.
Portanto, não coloquemos na mesma balança todas as orientações religiosas, mas vamos considerar a espiritualidade como a dimensão da relação do ser humano com o transcendente, à procura de um sentido de conexão com algo maior que si próprio: DEUS.
Daí consideremos a dimensão da espiritualidade, voltando-se para a saúde mental como equilíbrio e sentido da vida, podendo, assim, inferir que a espiritualidade/ religiosidade, quando bem integrada à vida do sujeito, contribui de forma positiva para sua saúde mental.
Já é atestado que a espiritualidade compõe um tema importante no viés da saúde mental. Os benefícios da junção entre espiritualidade e saúde como um todo estão presentes na literatura, pois tal junção pode ser aplicada de forma que venha melhorar a relação da pessoa com várias demandas apresentadas como consequência do sofrimento psíquico. A espiritualidade faz parte do processo de existência de cada um, e os profissionais de saúde devem respeitar e compreender o processo espiritual de cada pessoa que chega em busca de ajuda no serviço de saúde.
O momento atual tem propiciado o surgimento de várias doenças mentais/psicológicas, como resultante de uma sociedade adoecida e sem sentido de vida. O vazio existencial é uma das causas identificadas como desencadeamento dos vários casos do adoecimento mental/psicológico. Diante de tal realidade, a espiritualidade madura e integrada tem contribuído bastante para que as pessoas que buscam ajuda possam confiar na reversão dos quadros vulneráveis em vista do restabelecimento da “homeostase psicológica”.
Gostaria de afirmar aqui, a partir da minha prática na clínica, que tenho constatado que as pessoas que cultivam a espiritualidade têm demonstrado maior compreensão e consciência do processo psicoterápico de forma elaborada e confiante no restabelecimento da cura psicológica e consequentemente da integração em vista da individuação/realização.
Portanto, a dimensão espiritual conjugada com a ciência (psicologia, psiquiatria e outras) é uma importante ferramenta que pode ajudar no cuidado de pessoas em estado vulnerável da psique e que possuam riscos de autodestruição, entre os quais, o suicídio, assunto ainda considerado um tabu em nossa sociedade, que precisa ser conscientizada de que esse assunto é de fato um problema de saúde pública.
Nesse sentido, a espiritualidade pode contribuir fazendo com que a pessoa reflita sobre a condição de sua existência, criando possiblidades de ressignificar o sofrimento e encontrar-se consigo mesma de forma que favoreça a cura, pois a mesma mente que adoece é a mente que cura.
Referências:
FILHO, Waldemar Magaldi. Dinheiro, saúde e sagrado. São Paulo: Eleva Cultural, 2009.
JUNG. Psicologia e religião. 9. ed. Petrópolis: Vozes, 2011. v. 1
PERES, MFP.; Arantes, ACLQ; Lessa, PS; Caous, CA. A importância da integração da espiritualidade e da religiosidade no manejo da dor e dos cuidados paliativos.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script
https://pebmed.com.br/a-espiritualidade-e-o-suicidio-reflexoes-sobre-o-cuidado